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Leonardo Sakamoto

OAS entra na “lista suja” do trabalho escravo por obra em shopping de MG

Leonardo Sakamoto

02/07/2014 08h30

A multinacional brasileira OAS foi incluída, nesta terça (1), na atualização semestral do cadastro de empregadores flagrados com trabalho análogo ao de escravo mantida pelo governo federal, a chamada "lista suja". A empresa foi considerada responsável por reduzir à condição de escravos 124 pessoas na construção da torre comercial do Shopping Boulevard, em Minas Gerais. A assessoria de imprensa da empresa afirmou, em nota, que a inclusão da OAS é indevida porque "há decisão judicial que lhe garante o direito de não ser inscrita no referido cadastro." Os relacionados no cadastro não conseguem obter novos empréstimos de instituições financeiras federais e sofrem restrições do setor privado.

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O caso não tem relação com o resgate de 111 trabalhadores migrantes que haviam sido contratados para trabalhar na ampliação do aeroporto internacional de São Paulo, em Guarulhos, e acaram sendo resgatados de condições análogas às de escravo por auditores do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) no ano passado. Oriundos do Maranhão, Sergipe, Bahia e Pernambuco, eles passaram fome, segundo a fiscalização. A Construtora OAS firmou um acordo judicial com o MPT em que está investindo R$ 15 milhões em instituições e projetos voltados para a melhoria das condições de trabalho e na solução dos problemas encontrados.

De acordo com o site do MTE, nesta atualização semestral foram incluídos os nomes de 91 novos empregadores e excluídos 48. No total, são 609 pessoas físicas e jurídicas. O estado do Pará apresenta o maior número de empregadores inscritos na lista, totalizando cerca de 27%, sendo seguido por Minas Gerais com 11%, Mato Grosso com 9% e Goiás com 8%. A pecuária constitui a atividade econômica desenvolvida pela maioria dos empregadores (40%), seguida da produção florestal (25%), agricultura (16%) e indústria da construção (7%).

A matéria é de Daniel Santini, da Repórter Brasil, com a colaboração de Igor Ojeda e Stefano Wrobleski:

Ao todo, 124 trabalhadores foram resgatados da construção de torre de shopping em Minas Gerais. (Foto: Divulgação/Boulevard Shopping)

Ao todo, 124 trabalhadores foram resgatados da construção de torre de shopping em Minas Gerais. (Foto: Divulgação/Boulevard Shopping)

A caracterização da escravidão foi resultado de operação de fiscalização e monitoramento realizada de junho a outubro de 2013 pelos auditores fiscais Audria Kelle Gontijo Rebelo e Fábio Antônio Araújo, do Ministério do Trabalho e Emprego. Além de submeter os trabalhadores de maneira sistemática a jornadas exaustivas, a empresa também é apontada como responsável pelo aliciamento de migrantes, sendo que a maioria dos escravizados é proveniente do interior da Bahia. A OAS, segundo a fiscalização, ignorou a Instrução Normativa 90, que determina que o contratante deve garantir o transporte de trabalhadores de outras localidades, bem como arcar com todos os custos decorrentes da viagem.

A empresa é hoje um conglomerado multinacional presente em mais de 20 países e com atuação em áreas diversas. Além de obras nos setores públicos e privados na construção civil, a empresa tem projetos de saneamento, de estádios, e atua na administração de concessões públicas e desenvolvimento de tecnologia militar, entre outras.

Ao entrar na "lista suja" a OAS, assim como as demais 91 empresas incluídas nesta atualização, fica impossibilitada de receber financiamentos públicos e de diversos bancos privados, além de não receber restrições de negócios com as empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Mantido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), o cadastro é uma das principais ferramentas no Brasil para o combate do trabalho escravo contemporâneo. Atualizada a cada seis meses desde sua instituição no final de 2003, os nomes são incluídos após os autos de infração transitarem em julgado administrativamente com direito à defesa e mantidos por, pelo menos, dois anos na relação – saindo após quitarem seus débitos com o ministério e não reincidirem na prática.

Uma das maiores construtoras do Brasil, a OAS é também a terceira empresa que mais faz doações a candidatos de cargos políticos, segundo levantamento do jornal Folha de S. Paulo.

Obras públicas – Outros dos flagrantes que basearam esta atualização aconteceram em obras públicas, incluindo as do programa do governo federal de habitação popular Minha Casa Minha Vida, em que resgates têm sido uma constante. A Federação das Entidades Comunitárias e União de Lideranças do Brasil foi responsabilizada por flagrante em Alagoas; a J. Soares Construtora e Incorporadora Ltda.

Também foi incluída a Teixeira & Sena Ltda, construtora subcontratada pela MRV para a construção de um condomínio em Contagem (MG), outra obra financiada com recursos públicos. A MRV, que já foi flagrada por quatro vezes e incluída na "lista suja" em duas diferentes ocasiões, não entrou no cadastro desta vez.

Flagrantes de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) também basearam inclusões. A TIISA, empresa contratada para trabalhar na construção da Ferrovia Norte-Sul, obra estratégica de infraestrutura do PAC, foi incluída por submeter seis trabalhadores a condições degradantes.

A Construtora Central do Brasil S.A foi incluída por escravizar quatro pessoas em obra do PAC para a duplicação da BR-060, entre Jataí e Goiânia. O grupo, segundo reportagem do jornal O Globo, se associou ao governador de Goiás e candidato à reeleição Marconi Perillo (PSDB) para a compra de um terreno em 2008.

Política – Donos de construtoras também estão na atualização, como Luiz Otávio Fontes Junqueira, proprietário da Construtora Centro Minas (CCM), envolvido em escândalo de corrupção em obra da BR-153 no Tocantins. Ele foi incluído pelo resgate de 14 trabalhadores na Fazenda Caribe, em Brejo Grande do Araguaia (PA).

Já a Construtora Jurema foi responsabilizada por submeter seis trabalhadores à escravidão em obra de limpeza de faixa de domínio da Rodovia BR-343, na zona rural de Amarante (PI). O grupo pertence à família do deputado federal Marcelo Castro, que é presidente regional do PMDB e chegou a ser pré-candidato ao governo do estado – ele desistiu para tentar a reeleição como deputado. Assim como a CCM, o grupo Jurema também enfrentou escândalo de corrupção recente. Em 2010, o Ministério Público Federal chegou a recomendar nova licitação para construção de adutora por irregularidades no processo de licitação e contratação.

A Zaquieu Arquitetura e Construção Ltda foi incluída por empregar trabalho escravo em construção de prédio da Universidade Federal de Juiz de Fora. Nesta caso, segundo o relatório de fiscalização do MTE, os trabalhadores viviam em alojamento tão lotado que alguns improvisaram tábuas para garantir um mínimo de privacidade.

Também foram constatados casos envolvendo obras estaduais. A Aliança Engenharia e Serviços Ltda foi incluída por flagrante no roço da vegetação junto à linha de distribuição da CEMAR (Companhia Energética do Maranhão).

Assim como na última atualização do cadastro, os casos na construção civil provocaram um aumento do número de inclusões baseadas em flagrantes de escravidão urbana.

Confira a relação completa de inclusões e exclusões na "lista suja" nesta atualização:

Inclusões:
A.R.O.B. Serviço e Construção Ltda 03.045.121/0001-48
Ademir Andrade de Oliveira 705.704.936-68
Agrisul Agrícola Ltda 04.773.159/0004-42
Agroflorestal MR Ltda 14.943.201/0001-37
Agropecuária Gado Bravo Ltda 01.547.696/0001-33
Alcopan Álcool do Pantanal Ltda 37.497.237/0001-30
Alexandre Menini Vilela 339.878.312-00
Aliança Engenharia e Serviços Ltda 37.395.993/0001-58
Altair Pimenta Lima 076.430.551-49
Alvorada do Bebedouro S/A – Açúcar e Álcool 21.706.155/0001-18
Amira Fares Kabbara 02.897.003/0001-03
André Guimarães Construções, Montagens e Serviços Ltda 03.316.710/0001-13
Ângela de Castro Cunha Fachini 011.755.618-19
Antônio Fábio Gardingo 200.665.036-04
Antônio Ramos Caiado Filho 068.614.581-04
API SPE 24 Planejamento e Desenvolvimento de Empreendimentos Imobiliários 08.861.282/0001-23
Bella Aliança Agropecuária Ltda 06.954.773/0001-93
Bonamate Indústria & Comércio de Erva Mate Ltda 01.650.034/0001-94
Calixto e Dias Serviços Ltda 04.522.544/0001-74
Carlos Augusto da Paz Rocha 140.950.413-15
Celeste Rodovalho 331.015.821-72
Central Energética Paraíso S/A 07.752.894/0001-15
Claudionor Hilário da Silva 091.671.021-15
Construtora Central do Brasil S.A 02.156.313/0001-69
Construtora Emcasa Ltda 00.897.902/0001-72
Construtora Jurema Ltda 05.802.590/0001-90
Construtora Tenda S/A 71.476.527/0037-46
Copermil Construtora Ltda 20.177.903/0001-50
Domingos Alves Mendonça 163.378.401-00
Eduardo Barbosa de Mello 810.807.946-20
Erildo José Canal 493.804.007-72
Ernesto Andreola 326.945.712-04
Federação das Entidades Comunitárias e União de Lideranças do Brasil 01.784.633/0003-62
Fernando Barbosa Teixeira 617.739.301-25
Flávio Ribeiro Junqueira 757.686.316-15
Francisco José dos Santos 151.517.352-68
Gep Indústria e Comércio Ltda 61.075.594/0001-94
Gesso Brasil Ltda 11.340.292/0001-28
Gustavo Araújo da Nóbrega 799.006.234-87
Construwitta Construtora e Incorporadora Ltda (Habitte Incorporadora) 11.953.881/0001-81
J Soares Construtora e Incorporadora Ltda 01.154.626/0001-15
J. Ribeiro da Rosa 07.508.426/0001-08
Jaciel Cover ME 05.240.799/0001-07
Jailes da Silva Ataídes 827.025.861-04
Jaime da Silva Pereira 068.999.782-53
Jardim do Éden Indústria e Comércio Ltda 03.724.698/0001-86
João Batista Martins de Moraes 635.739.547-15
João Batista Rabelo Santos 822.472.186-87
Joari Bertoldi 219.697.520-68
Jorge de Souza Moreira 075.206.541-68
José Alberto Lemos 061.107.201-78
José Álvares de Rezende 018.447.506-63
José Amaro Logrado 023.040.151-15
José Luiz Koeche 250.475.909-68
José Volmi de Souza 443.308.479-49
La-Fee Confecções Ltda 00.138.268/0001-94
Línea Obras & Construções Ltda EPP 05.452.327/0001-18
Lúcio de Cássio Vieira de Oliveira 517.237.352-72
Luiz Otávio Fontes Junqueira 303.269.316-00
Mar Quente Confecções Ltda 02.732.234/0002-30
Márcio Volpato Cataneo 271.705.602-59
Maria de Lourdes Ribeiro Fragelli 981.788.301-91
Marino Stefani Colpo 718.455.691-72
Maris Adriana Covatti 426.398.830-20
Marlúcio Queiroz Pimenta 680.711.597-00
Mastel Montagem de Estruturas Metálicas Ltda 07.531.421/0001-98
Menegildo Rodrigues de Moura 052.736.175-53
Miguel Eugênio Monteiro de Barros 419.512.397-68
Minas Refloresta S.A. 07.165.412/0004-73
Natal Ferreira da Silva 155.801.052-15
Nelsinho José Armani 001.635.807-40
Norlândio Souza Azevedo 040.649.194-16
OAS S. A. 14.811.848/0011-87
Osvaldo Alves Ribeiro 005.702.142-20
Paulo Afonso de Lima Lange 163.605.751-91
Quintino Pereira Araujo 088.079.812-20
Raul Cezar Esteves de Souza 573.114.471-00
Renato Junqueira Meirelles 013.578.918-49
Rio Real Empreendimentos Ltda 01.642.083/0002-66
Roberto de Castro Cunha 994.261.708-63
Ronaldo Araújo Costa 292.942.742-68
Saudibras Agropecuária Empreendimentos e Representações Ltda 50.591.098/0001-77
Silobay do Brasil Confecções Indústria e Comércio Ltda 11.248.974/0001-05
Simirames Afonso da Silva 012.666.241-04
Teixeira & Sena Ltda 16.660.902/0001-94
Tenda Negócios Imobiliários S.A 09.625.762/0004-09
TIISA – Triunfo Iesa Infra-Estrutura S/A 10.579.577/0003-15
Tocos Agrocanavieira S.A. 74.185.174/0001-02
Úrsula Zimmerli Johansen 369.300.759-49
Wilker Marques Campos 937.903.252-87
Zaquieu Arquitetura e Construção Ltda 09.513.415/0001-33

Exclusões:
Abimael Jesus Moreira 617.714.301-68
Abner Jesus Moreira 01.383.301/0001-04
Adriano Carlos Piasseski 811.083.549-04
Adriano Dale Laste 944.302.099-87
Agenor Batista dos Santos 050.037.683-20
Agropastoril Gaboardi Ltda 79.249.082/0001-62
Agropecuária Ribeirópolis Ltda 32.989.204/0002-74
Aloir Scariot 518.425.729-20
Antônio Alves da Silva 438.062.522-20
Bruce Barbosa Guerra 865.125.284-68
Chaules Volban Pozzebon 408.932.192-15
Darcy Piovesan 127.086.589-72
Edson Ragagnin 868.743.491-04
Eliana Camara Biagioni 325.549.666-72
Fazenda 5S 005000853298-84 (CEI)
Gerson Botelho de Frias 359.295.102-53
Idércio Lemes do Prado 088.484.321-15
Inácio Pereira Neves 013.185.861-00
Indústria e Comércio de Erva Mate Tiecher Ltda 07.972.739/0001-04
João Altair Caetano dos Santos 368.413.239-04
João Arruda Construção e Mineração Ltda 09.299.512/0001-75
Joaquim Gonçalves Rodrigues 025.150.321-68
Jorge Gonçalves de Almeida 041.161.366-97
José Correia Filho 077.831.988-13
José Edinaldo Costa 116.290.615-49
Laci Dagmar Zoller Ribeiro 080.146.559-15
Laurélio Rogemar Kochenborger 636.370.300-04
Lauro Tramontini 006.061.011-52
Leandro Pilocelli 781.704.191-15
Lir Rufatto 244.575.079-20
Luciano Aparecido Correia 836.942.859-20
Maicon Lima Rampelotti 007.256.971-99
Manoel Diniz 167.384.381-68
Marcelo Alves Costa 074.707.488-73
Marcelo Sampaio Corrêa 796.283.621-00
Márcio Adriano Pereira da Silva 822.613.851-53
Marcos Kuhn Adames 383.805.360-53
Marcos Roberto Pereira da Silva 849.174.826-15
Mauro Nascimento dos Santos Barros (espólio) 440.100.795-68
Nantes Lenhadora Ltda ME 07.194.268/0001-50
Paulo Davit Baldo 199.997.390-91
René Pompêo de Pina 004.546.211-91
Takao Hamano 237.535.449-49
Usina Cruangi SA 11.809.134/0001-74
Volnei Modesto Diniz 136.905.741-53
Waldemar Vilhena 059.267.506-87
Walmir de Souza 436.527.789-87
Yong Gul Kim 063.404.058-86

Atualização de 09/07/2019: 

A Bella Aliança Agropecuária (CNPJ 06.954.773/0001-93) solicitou que fosse veiculada a informação de que a Justiça Federal no Acre julgou improcedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra Ricardo Valadares Gontijo, Mário Mariano e Elmo Clemente José Gomes pelo crime de redução à condição análoga à de escravo, em 26 de julho de 2012. A denúncia foi embasada em fiscalização na fazenda Bella Aliança, na qual fiscais do trabalho resgataram trabalhadores. A ação transitou em julgado sob o processo 2010.30.00.001535-5.

A inclusão no cadastro de empregadores responsabilizados por mão de obra análoga à de escravo, conhecido popularmente como "lista suja", é independente das decisões do Poder Judiciário e ocorre após o trânsito administrativo da autuação no âmbito do Poder Executivo federal. A lista divulgada por esta matéria deu transparência a esse ato do poder público. A área responsável pela atualização da lista no governo confirma que a inclusão do empregador no cadastro, em julho de 2014, cumpriu as exigências da portaria que previa a lista na época.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.